06/08/2018 as 13:13
Meio ambienteA ação é feita numa parceria entre a PMA, o Riomar Shopping, a Universidade Federal de Sergipe (UFS) e o Instituto Canto Vivo.
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É raro alguém não associar Aracaju a caranguejo, inclusive, um dos pontos turísticos da capital é dedicado a ele, até com uma escultura gigante para simbolizar a importância que o crustáceo tem, não somente para a cidade, como para todo o estado. O reduto desse símbolo da culinária e cultura sergipanas, no entanto, está sendo degradado e essa perda tem sido motivo de preocupação, inclusive por parte da Prefeitura de Aracaju que, através da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Sema), tem atuado para conservar os manguezais que, apesar de serem lembrados pelo caranguejo, possuem uma importância ambiental muito mais abrangente.
Quem percorre a cidade, consegue perceber a presença dos mangues na região urbana e essa presença intensa tem uma justificativa: Aracaju foi erguida, praticamente, em cima de mangues. Se em 1855, ano de surgimento da capital sergipana, não existia a preocupação sobre os efeitos ambientais que a construção mal planejada poderia causar, nos tempos de hoje, quando o meio ambiente pede socorro, ações efetivas se fazem essenciais para proteger o ecossistema.
Uma parceria entre a Prefeitura de Aracaju, o Riomar Shopping, a Universidade Federal de Sergipe (UFS) e o Instituto Canto Vivo, iniciou as atividades do projeto "Muda Mangue", uma iniciativa que tem como objetivo manter os mangues vivos através do plantio de mudas, além de sensibilizar a população por meio da educação ambiental. Nesta primeira ação do projeto, que aconteceu às margens do rio Poxim, foram plantadas 400 mudas, 200 advindas do Viveiro Florestal do Riomar e as outras 200 do Instituto Canto Vivo. Na oportunidade, estudantes tiveram um momento onde puderam saber mais sobre a formação e importância do bioma através da explanação de uma pesquisadora da UFS.
A ação, no entanto, foi apenas o ponto de partida para demais realizações voltadas para a conservação dos manguezais de Aracaju, como colocou o secretário municipal do Meio Ambiente, Augusto César Viana. "Manguezal é um bioma de uma dos mais importantes para a proteção do ecossistema, preservação da flora e da fauna, como também para a população que vive e sobrevive do mangue. Infelizmente os manguezais vêm sofrendo muito com a degradação, seja ela na região Norte, pelo pessoal de baixa renda em busca de moradia, ou seja pela especulação imobiliária na região Sul da cidade, e isso tem impactado sensivelmente no bioma manguezal. A Sema, junto com esses parceiros, iniciou um projeto que tem como objetivo também trabalhar a pesquisa para que possamos agir de forma mais efetiva nos locais em que os mangues têm sido mais atingidos. Trabalhamos também com a linha da educação ambiental e estamos começando um trabalho sistêmico e extensivo junto às escolas, e iremos implementar outros projetos. Existe ainda uma ideia de implementarmos um ‘barco escola' para circular os nossos rios e mostrar de perto essa realidade que precisa ser cuidada", afirmou.
No âmbito da conscientização, eixo importante nas ações de conservação, a Sema tem atuado em diversas vertentes, sobretudo para sensibilizar as novas gerações que são as grandes responsáveis pelas realizações futuras. "Nós trabalhamos muito mais voltados para a educação formal, para grupos de escolas, grupos de jovens. E agora estamos iniciando uma nova proposta voltada para a comunidade. Inclusive, o projeto Muda Mangue é apenas um ponto de partida para outras ações. É preciso fazer com que a população tenha o sentimento de pertencimento do meio ambiente. Queremos trazer as pessoas para perto desse plantio, do cuidado, para mostrar a importância do manguezal como um berçário da vida marinha e, inclusive, na redução da poluição, dos impactos ao meio ambiente. A partir desse projeto, começaremos os estudos para formar um diagnóstico dos manguezais da cidade até para que possamos fazer um plantio mais direcionado, de acordo com a necessidade de cada um, além de atuar de maneira mais efetiva", destacou a coordenadora de Educação Ambiental da Sema, Raphaella Ribeiro.
Construído no entorno de manguezais, o Riomar Shopping, parceiro no "Muda Mangue", entende a necessidade de reduzir os efeitos causados pelas construções que circundam o bioma. Por isso, além do projeto em parceria com a PMA, o Instituto João Carlos Paes Mendonça, grupo que coordena as ações de compromisso social do empreendimento comercial, atua também com o projeto "Jogando Limpo com o Mangue", cujo um dos atos realizados é a coleta de resíduos sólidos no mangue que, devido à quantidade de lixo descartada, tem algumas áreas em decadência. "A gente sabe que o mangue vem sofrendo bastante e a ideia é recuperar as áreas que são passíveis de recuperação e, assim, fazer eventos como o ‘Muda Mangue'. Nosso objetivo é também conscientizar e o plantio de mudas será contínuo", frisou a analista ambiental do Riomar, Vivianne Andrade.
De acordo com a analista, a espécie escolhida para ser plantada foi o mangue-vermelho. "Temos dois tipos de mangue em Aracaju, o vermelho e o branco. Escolhemos o vermelho porque, além dele ser pioneiro em áreas mais degradadas, ele se adapta melhor em áreas abertas, vulneráveis. Ele tem maior facilidade em se adaptar em condições de degradação que, infelizmente, vemos muito na capital", ressaltou Vivianne.
Efeitos
Um dos principais efeitos da degradação dos mangues e que pode ser sentido fortemente em Aracaju é quando a chuva cai. Enquanto muita gente culpa o poder público pelas enchentes e alagamentos, a destruição dos mangues também tem participação nesse efeito pluvial.
Muitos bairros da capital foram construídos em cima de aterros e hoje sofrem com os efeitos e isso ocorre porque, entre outros fatores, não foram respeitados os limites do meio ambiente. Como é uma região litorânea e no nível do mar, quando a maré sobe, sobretudo em épocas de chuva, não há como toda a água ser escoada e os manguezais fazem justamente o papel de regular do nível do mar, entre outras importantes funções naturais.
Ambiente de transição entre o terrestre e o aquático, os manguezais correspondem a uma área de cerca de 250km² de Sergipe, o que equivale a pouco mais de 1% de todo o território, mas, poderia ser ainda maior se não fosse a ação do homem ao longo dos anos.
Para a professora de Biologia e pesquisadora da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Sindiany Caduda, que trabalha desde 2008 com a área costeira e estuda manguezais desde 2012, nos últimos anos houve uma redução intensa das áreas de mangue. "Os mangues mais extensos do estado estão no litoral Sul, só que isso vem sendo perdido ao longo dos anos em virtude da especulação imobiliária e em virtude de outras práticas de degradação, especialmente a carcinicultura (criação de crustáceos) que tem avançado de forma exponencial, tanto no litoral Sul, quanto no litoral Norte, e aqui, enquanto manguezal urbano, estamos rodeados de mangues. O bairro Jabotiana tem perdido seus hectares de mangue. Na Coroa do Meio e Atalaia também preocupa pela perda dessas áreas. O rio está sendo cada vez mais assoreado, os mangues têm sido sedimentados, a comunidade não tem sido sensibilizada a respeito da importância dos mangues que tem feito de depósito de resíduos sólidos, até depósito de material de construção na área. Hoje, a gente tem muito mais a pensar no que fazer com os manguezais do que a comemorar", alertou.
Um outro efeito que tem sido visto em Aracaju está na região entre os conjuntos Augusto Franco e Orlando Dantas, na zona Sul cidade. Por lá, foram observados híbridos de mangue, que são espécies que estão começando a apresentar estruturas diferentes em virtude da degradação sofrida. "Ainda não tínhamos visto esse tipo de espécie. As plantas estão apresentando novas estratégias de sobrevivência, inclusive, já existem estudos em São Paulo para avaliação genética de plantas e pensamos em trazer isso para cá para verificar o que é que está acontecendo com essas plantas, qual o nível de poluição, de contaminação dessas áreas", ressaltou a pesquisadora.
Sindiany chamou atenção para outra retrato da capital: o odor que é sentido na 13 de Julho. "Aquele cheiro forte não é do mangue, propriamente dito. Aquilo é cheiro de enxofre devido à decomposição de matéria orgânica, aquilo é o odor de esgoto que é jogado no local", salientou.
Segundo Sindiany, a preocupação com os manguezais não pode ser deixada para depois, ela é urgente e não é de hoje. "Os manguezais têm diversas funções como, por exemplo, regulador de mudanças climáticas e berçário da biodiversidade aquática e quando a gente fala disso é porque existem animais residentes, animais migratórios, animais que descansam, animais que se reproduzem e se utilizam das áreas de mangue para diversas estratégias de sobrevivência. A partir do momento em que destruímos as áreas de manguezais, esses animais ou são obrigados a mudar-se ou simplesmente desaparecem e com isso a população ribeirinha, que depende diretamente dos manguezais e nós que dependemos indiretamente, sofremos", frisou.
A pesquisadora alertou ainda que o plantio de mudas é importante, porém, somente ele não é capaz de resolver a situação atual. "Precisamos sensibilizar a comunidade para que as pessoas repensem o que tem sido feito dos manguezais e das consequências que podem ser geradas a partir disso. O poder público pode fazer a sua parte, mas, se a população não contribuir, de nada vai adiantar as ações. É preciso rever as nossas atitudes porque o chamamento é urgente", concluiu Sindiany.
AAN