21/01/2019 as 10:28

Praia

Jatobá: ponto turístico que esconde miséria e abandono

População denuncia descaso da prefeitura. Não há esgoto, iluminação, nem segurança.

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Jatobá: ponto turístico que esconde miséria e abandono

Um cenário que mistura as belezas naturais de uma praia e a imponência de dunas costeiras, com a modernidade de duas construções altamente tecnológicas, um parque eólico e uma usina termoelétrica. Este é o povoado Jatobá, localizado na Barra dos Coqueiros, a poucos minutos da sede da cidade. Por trás dessa mistura de paisagens, existe algo que visitantes, a própria população do município e, especialmente, o poder público, prefere não enxergar – ou fingir que não vê.


“Falta calçamento e iluminação nas ruas, atendimento digno no posto de saúde, creche, segurança, saneamento básico. São queixas de todos os tipos”, denuncia o líder comunitário da região, Josean dos Santos. O pior é que todo esse abandono e falta de estrutura ocorre em uma comunidade que abriga dois dos mais importantes investimentos feitos no Estado nos últimos anos. Obras que chegaram para mudar Sergipe, mas que, ironicamente, não levaram melhoria alguma para a localidade que as recebeu.


A dona de casa Daniela dos Santos, de 48 anos, conta que o único posto de saúde do povoado só funciona por dois dias da semana, quartas e sextas-feiras, com horário restrito, apenas pela manhã. “Tenho uma filha de sete anos. Se ela ficar doente nos momentos que a unidade está fechada, tenho que levá-la até a Barra dos Coqueiros”, reclama. Restrição também no transporte público que funciona na localidade. Por lá, as pessoas contam somente com uma linha de ônibus, que faz sua última passagem pela região às 19h.


“Já deixei de sair para me divertir, mas também fui impedido de fazer um curso no Senai, de mecânica, pois as aulas terminavam às 22h e eu não teria transporte para chegar aqui. Ninguém sai de casa à noite por causa disso”, relata. E se os jovens não conseguem sair, nem para estudar, também não conseguem ocupar o tempo com nada saudável, já que a quadra do povoado Jatobá está completamente abandonada. “Alambrados destruídos, traves arrancadas. Nem lâmpada a prefeitura coloca no local”, informa o líder comunitário, Josean dos Santos.


Segundo ele, a situação está assim há dois anos e a justificativa da administração municipal é de que o local não é regularizado. “Mas também não se faz nada para regularizar. O povoado antes tinha um time de futebol de salão que não existe mais por não terem local para treinar. A quadra mais próxima fica bem distante, e com a deficiência de transporte fica quase impossível para o time se deslocar”, complementa Josean.


Outra reclamação da população é com relação a um poste que passa no meio da rua. De acordo com o líder comunitário, os moradores entram em contato com a prefeitura para solicitar uma providência e lá a resposta é de que a responsabilidade do serviço é da Energisa. “Já concessionária de energia alega que só pode executar a obra com solicitação da gestão. Nesse vai e vem uma década já se passou e o poste continua plantado no meio da rua, causando acidentes e colocando a vida as pessoas em perigo”, desabafa.

Educação e moradia
A falta de unidades de ensino é outro problema relatado pelos moradores. Segundo ele, a única creche do povoado está fechada, deixando centenas de famílias desassistidas. A dona de casa Glória Maria dos Anjos, de 59 anos, faz parte desse grupo. Além de deixar a filha na creche, ela também trabalhada na instituição; agora está desempregada e com pequena tendo que estudar na sede da Barra. “Um transtorno em dose dupla. Não estou conseguindo nem pagar o aluguel. Estou morando com a minha mãe e não vejo a hora dessa situação mudar”, desabafou ela.


As crianças maiores e adolescentes também sofrem com o problema. A única escola de Jatobá só oferece turmas até o 5º ano do ensino fundamental. Quando os alunos saem dessa faixa, como é o caso da filha do comerciante José Erminio, precisa se deslocar até a sede do município. “Ela tem 13 anos e está na 7° série. Fico com o coração na mão a vendo pegar a rodovia sozinha com a criminalidade do jeito que está”, declara.
Essa mesma rodovia, a SE 240, abriga dezenas de família bem às margens. São pessoas que construíram barracos na beira da pista, embaixo de enormes fios de alta tensão da usina termoelétrica; sem água encanada, saneamento básico, tendo o mangue como quintal dos barracos, esquecidas pelo poder público, como relata o aposentado Hermínio Santos, de 72 anos. “Já tem quatro eleições que a gente vota e ninguém vem aqui ajudar, fazer um cadastro ou até mesmo dar uma cesta básica que seja”, lamenta.

Por todo o povoado também não se vê ruas calçadas. Quase 80% da região é feita de terra batida, segundo informa o líder comunitário do Jatobá. “Esgoto a céu aberto é outra realidade que nos deparamos diariamente, em quase todas as ruas. São cerca de 1500 pessoas vivendo aqui, esquecidas por quem deveria zelar pela população”, alega o líder comunitário, Josean dos Santos.

Ponto turístico?
Jatobá é muito mais conhecido pela sua faixa litorânea que pelo povoado em si. Mas até este ambiente, que deveria atrair turistas e a população local, sente o reflexo do abandono. Não passa ônibus, não há tratamento de esgoto, nem água encanada para todos. A iluminação pública também está bastante precária, segundo os moradores, e não é difícil se debater com lixo acumulado e espalhado em local impróprio.


O comerciante José Bispo dos Santos, de 75 anos, conhecido como Seu Turinga, é um dos fundadores da região e afirma que ela está mesmo abandonada. “Fora todos os problemas de infraestrutura, ainda convivemos com o medo da insegurança. Por aqui a polícia só aparece quando acontece algum crime, fora isso eles não mostram a cara”, ressaltou, criticando, ainda, o fato da termoelétrica não ter levado nenhum investimento para a localidade. “Depois da chegada dela, nada foi feito”, pontua.


Para Seu Turinga, se algumas melhorias fossem feitas na região, com certeza atrairia mais movimento para a praia, o que incentivaria a economia local. “Os empresários se interessariam em construir pousadas, restaurantes, e assim desenvolver o povoado. A praia tem várias residências de alto padrão, mas que só servem para o descanso de poucos. Se o governo visse aqui como um lugar de turismo e investisse, a vida de muita gente iria mudar para melhor”, sugere.

Resposta da prefeitura
A Prefeitura da Barra dos Coqueiros, através do secretário de Comunicação, Elton Rickarty, se manifestou acerca de todos os pontos citados pelos moradores do Jatobá. Sobre a creche ele informa que “foi um espaço criado pelo líder dessa ocupação indevida, que a justiça mandou fechar por perceber que estava sendo usada de fachada e sem estrutura para atender as crianças, que eram manipuladas pelos invasores, para tentar ludibriar e sensibilizar a todos. Sem previsão de ser reaberta por estes motivos”.

A informação do posto de saúde, segundo ele, não procede, pois a unidade atende com uma equipe do Programa de Saúde da Família (PSF), de segunda a sexta-feira, nos dois turnos; incluindo, ainda, atendimento odontológico para os moradores das comunidades do Capuã, Jatobá, Touro, Canal e Pontal da Ilha. O secretário de Comunicação também informa que a Smtt/Barra já solicitou a ampliação das linhas e aguarda estudo de viabilidade por parte das empresas, do consórcio que envolve todos os municípios da grande Aracaju e também do estado, uma vez que envolve questões de segurança.

No caso da quadra de esportes, com base nas informações da Secretaria de Obras, Elton explica que a prefeitura está em processo de construção de três quadras esportivas: na Escola João Cruz, na comunidade Andorinhas e outra no Bairro Marivan. “Tão logo sejam concluídas, será iniciada a reforma da quadra do Povoado Jatobá”, garante. Sobre a pavimentação das ruas, ele alega que as que não possuem asfalto ou paralelepípedo são, justamente, as que se encontram em área de preservação ambiental e de Marinha. “Lembrando que algumas aguardam decisão judicial, por se tratar de ocupação indevida”, enfatiza.

A prefeitura esclarece, também, que é feita a manutenção na parte de iluminação baixa, em todos os povoados, com plantão até no final de semana. Porém, segundo o secretário, nas áreas de BR e ocupações indevidas estão judicializadas e não podem receber nenhum tipo de melhorias. “Em caso de desobediência, estamos sujeitos as penalidades”, pontua Elton. Sobre a escola, Elton Rickarty afirma que a administração disponibiliza ônibus para as crianças das outras series e atende as comunidades do Porto, Caatinga, Praia, Cajueiro, incluindo as crianças das ocupações indevidas, em concordância com o Ministério Público.


“Já sobre as famílias que montaram seus barracos à margens da rodovia, é uma área de invasão, a qual a prefeitura está impossibilitada de fazer qualquer benfeitoria, uma vez que eles ocuparam uma área de preservação ambiental e aguardam determinação judicial”, esclarece. A ampliação da rede de esgoto e do abastecimento de povoado, segundo ele, já foi solicitada à Deso, e o lixo, de acordo com o secretário de Comunicação, demonstra a falta de responsabilidade e cuidado das pessoas que vivem nessas áreas, uma vez que regularmente a coleta do lixo é feita pela empresa Via Norte.