01/06/2020 as 07:47

FESTA JUNINA

Cancelamento dos festejos juninos gera prejuízos para economia sergipana

Milhares de trabalhadores autônomos, de diversos segmentos, já sofrem os impactos econômicos. Em situação de Calamidade Pública, prefeituras deverão canalizar recursos para o combate à epidemia

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Período aguardado com maior expectativa por toda população do estado, não apenas para quem procura cultura e divertimento, mas, sobretudo, para quem precisa de emprego e renda, o São João deste ano não deixará saudades. O cancelamento dos festejos juninos em Sergipe, decretado no dia 26 de março, pelo governador Belivaldo Chagas, em decorrência da crise sanitária provocada pelo novo coronavírus, promoveu impactos severos na vida de milhares de trabalhadores autônomos, que fazem do período sua principal fonte de renda.

Nas administrações municipais, como se não bastasse a situação de Calamidade Pública, que obriga gestores a canalizar recursos que seriam injetados nas festas para o combate à epidemia, a queda na arrecadação, nos últimos dois meses, também dificulta que medidas possam ser tomadas para mitigar os efeitos da crise.

Neste domingo, 31, o pequeno município de Areia Branca, como de tradição, estaria realizando a abertura oficial dos festejos juninos no estado. A gestão municipal previa investir cerca de R$ 1,3 Mi na realização da festa, porém perdeu em arrecadação (ICMS, FPM, e royalties) cerca de R$ 1,2 Mi, nos últimos dois meses. Com perdas no orçamento e uma crise para gerenciar na saúde, o prefeito do município, Alan de Agripino, lamentou o impacto que o cancelamento da festa tem causado na vida de centenas de trabalhadores autônomos e ressaltou que o momento requer maior atenção com a saúde. “O São João de Areia Branca é uma festa consolidada no calendário de shows e eventos do Nordeste. E a abertura, no dia 31 de maio, é uma tradição, que reúne um público de cerca de 70 mil foliões, de várias partes do estado e de fora dele.

Sem a realização da festa, temos aí um impacto considerável na geração de emprego e renda para muitos vendedores, para o comércio local, mercadinhos, mercearias, lojas de roupas, cabeleireiros. Só de vendedores na festa são mais de 200 ambulantes que saem prejudicados, sem falar dos que ficavam do lado de fora do Forródromo”, destaca Alan de Agripino. A situação desencadeia prejuízos que afetam desde o comércio local, que se prepara o ano inteiro para receber um volume de visitantes que, em alguns lugares, chega a ser quatro vezes maior do que o número total de habitantes da própria cidade, até diferentes setores da produção turística, como transporte, hotelaria, lojas, bares e restaurantes. Além disso, há ainda uma imensa variedade de ofícios que garantem renda para milhares de trabalhadores, neste período, como fogueteiros, costureiras, trios pé-de-serra, produtores de comidas típicas, e dezenas de grupos de quadrilhas juninas.

BARCOS DE FOGO
Berço da cultura junina no estado, o município de Estância ficou famoso pela tradição dos barcos de fogo, dos cortejos folclóricos, das apresentações de quadrilhas juninas e dos grandes shows artísticos promovidos durante as noites. O orçamento destinado aos festejos juninos impulsiona sobremaneira a economia da cidade. De acordo com o prefeito, Gilson Andrade, o município chega a movimentar, nesse período, algo em torno de R$ 8 milhões, sendo que, deste total, cerca de R$ 3 milhões são injetados do próprio orçamento municipal na promoção da festa.

Recursos que, segundo ele, são consumidos pela própria economia local. “Infelizmente, os impactos serão graves com o cancelamento, seja pela perda da autoestima da população estanciana, que respira sua cultura junina, seja no tocante ao turismo local e a economia”, frisa Gilson Andrade. Entre os diversos segmentos impactados no município, talvez a situação mais dramática seja a dos fogueteiros. Detentores de uma tradição secular, os artesãos que produzem fogos de artifício e são responsáveis pelo principal produto turístico do São João de Estância, o Barco de Fogo, estão parados e sem perspectivas para o futuro próximo.

No município há duas associações que congregam oficialmente 30 fogueteiros, mas segundo informações levantadas, o número total no município chega a quase 70. No ano passado, as Entidades receberam, mediante contratos firmados com a administração municipal para o fornecimento de fogos de artifício, como barcos de fogo e espadas, um total de R$ 256 mil. Para este ano, diante do cancelamento dos festejos, os artesãos estão sem produzir e preocupados com os próximos meses, sem a obtenção da renda necessária. “Essa é a primeira vez, nesses meus 70 anos de vida, que vejo o São João de Estância ser cancelado. Então, é algo muito difícil para nós, que passamos o ano inteiro produzindo para tirar o sustento nesse único mês”, explica o fogueteiro José Dionísio dos Santos (Seu Dió), que há 30 anos trabalha na fabricação de fogos de artifício para os festejos juninos. Ele explica que a maioria dos fogueteiros do município é composta de pescadores, que entre os meses de setembro e junho trabalham somente na fabricação dos fogos. “Agora estamos numa encruzilhada. Muitos de nós tiveram que pegar dinheiro emprestado para comprar materiais e agora não sabem nem como vão pagar. É tudo muito triste. Estamos na expectativa que seja aprovado um auxílio da prefeitura”, complementa José Dionísio. O auxílio a que o fogueteiro se refere é uma das medidas que a prefeitura de Estância estuda para mitigar os impactos do cancelamento da festa. O auxílio propõe um repasse, que pode variar entre R$ 500 e R$ 2.500 para músicos locais, fogueteiros e quadrilheiros para o mês de junho.

FESTA DO MASTRO
Destacada como a melhor festa de São Pedro do estado, aquela que também encerra os festejos juninos em Sergipe, a tradicional festa do Mastro de Capela, realizada há mais de 70 anos, é considerada o produto de maior potencial para economia do município. De acordo com a prefeita de Capela, Silvany Mamlak, a cidade consegue arrecadar seis vezes mais com a festa do que é gasto na organização. São gerados, no período, mais de 7 mil empregos. “Diante da atual questão da saúde e da questão financeira, percebemos que já iríamos ter dificuldades, em 2020. Por isso, de forma antecipada, tomamos essa decisão de cancelar. E, diante dela, os impactos são imensuráveis. Não somente pela questão cultural, da tradição junina que deixa de ser celebrada com vigor e alegria, como sempre fizemos em outros anos.

Particularmente, fico bastante entristecida com isso. É, sem exagero, um trauma sem tamanho para a sociedade capelense, que se identifica com a festa e também porque há a queda do maior potencial da economia capelense. Para se ter ideia, essa festa representa, hoje, aproximadamente 60% da população que empreende nesse período”, enfatiza a prefeita de Capela, Silvany Mamlak.

De acordo com ela, o São Pedro de Capela é como se fosse o 13º salário dos comerciantes locais, e isso se reflete em todos os segmentos da economia. “Na verdade, o prejuízo é incalculável. Não é possível fazer um cálculo exato nesse sentido. No ano passado, o crescimento da economia ocorreu de forma que superou todas as nossas expectativas. No São Pedro, cada família quer fazer seu próprio empreendimento, quer fazer algum comércio, para que possa gerar alguma renda. Com o cancelamento do São Pedro de Capela, por causa do coronavírus, muita gente no município será prejudicada”, complementa Silvany.