27/04/2024 as 04:42

ENTREVISTA

“Segipe já passou do tempo de ter um bom atendimento a doentes com câncer”



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Sheyla Galba

A vereadora Sheyla Galba (União Brasil), militante do movimento em defesa das pessoas atingidas pelo câncer em Sergipe, avalia que já passou do tempo de se ter um bom atendimento às pessoas atingidas pela doença no estado. E afirma: “E se o bom atendimento ainda não é uma realidade na rede pública o motivo é a falta de vontade política”. Ela ressalta, em entrevista ao Jornal da Cidade, que “temos profissionais de extrema competência e dedicação, temos recursos, tecnologia e conhecimento de sobra, mas falta a disposição dos nossos gestores para fazer valer um direito que é assegurado pela Constituição”. Sheyla lembra ainda que a estimativa mais recente do Instituto Nacional de Câncer (INCA) aponta o surgimento de 6.450 novos casos de câncer em Sergipe por ano, sendo o de mama e de próstata os que têm maior incidência na população”.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

 

Por Eugênio Nascimento 

 

JORNAL DA CIDADE - Há realmente uma preocupação das autoridades estaduais e municipais com o câncer?

SHEYLA GALBA - O ponto central dessa questão não é se existe ou não preocupação. Naturalmente, toda pessoa se sensibiliza diante de um paciente oncológico, mas o que falta em nossas autoridades é o senso de urgência, a compreensão de que um dia vale muito para uma pessoa que está tratando um tumor. Quando nossos gestores tiverem essa clareza, com certeza os serviços de saúde vão ser mais efetivos porque hoje eu recebo relatos até da falta de soro fisiológico na Oncologia do Huse. Ou seja, até mesmo os profissionais da saúde enfrentam uma situação delicada para prestar a assistência adequada aos pacientes.

 

JC – Por que SE ainda não tem um bom atendimento? Já é tempo?

SG - Já passou do tempo. E se o bom atendimento ainda não é uma realidade na rede pública, o motivo é a falta de vontade política. Nós temos profissionais de extrema competência e dedicação, temos recursos, tecnologia e conhecimento de sobra, mas falta a disposição dos nossos gestores para fazer valer um direito que é assegurado pela Constituição. Muitas vezes, iniciativas simples fazem uma enorme diferença. Vou dar um exemplo. Desde o ano passado, a Secretaria Municipal de Saúde de Aracaju implantou o Projeto de Navegação de Pacientes Oncológicos, proposto pelo meu mandato e aprovado pela Câmara de Vereadores em 2022. O projeto piloto é realizado na Unidade Básica de Saúde Lauro Dantas, no bairro Bugio, sendo destinado a pacientes com câncer de mama e câncer de colo do útero. Ele permite o acompanhamento dos casos de suspeita ou de confirmação da doença com abordagem individual e orientações a cada paciente. Isso garante mais celeridade e assertividade no tratamento e, como resultado, o aumento significativo das chances de cura. Agora estamos trabalhando para ampliação do Projeto para outras unidades de saúde da capital e até mesmo outros municípios sergipanos.

 

JC - Por que tem sido difícil a marcação de consulta para atendimento médico? E para exames?

SG - Pelo mesmo motivo citado na resposta anterior, a ausência de vontade política para priorizar a gestão da rede de assistência oncológica no estado. Essa semana eu recebi o relato de uma paciente com diagnóstico de câncer de cabeça e pescoço que só conseguiu marcar a sua primeira consulta para o dia 10 de julho. Veja, estamos no mês de abril. Esperar três meses para tratar um câncer em Sergipe, além de um desrespeito à legislação, é uma sentença de morte.

 

JC - O câncer atinge muita gente em Sergipe? É mais mulher ou homem?

SG - A estimativa mais recente do Instituto Nacional de Câncer (INCA) aponta o surgimento de 6.450 novos casos de câncer em Sergipe por ano, sendo mama e próstata os que têm maior incidência na população. É importante frisar que cerca de 40% desses casos são estimados para a capital sergipana. Já em relação ao gênero, os estudos do INCA mostram que o percentual é bem parecido, mas com uma leve prevalência entre as mulheres.

 

JC - Ocorrem muitas mortes por câncer em Sergipe? Mais mulheres ou homens?

SG - Infelizmente, esses são dados que nós não temos de maneira concreta. O que é lamentável porque são informações de fundamental importância para a definição das políticas públicas de assistência oncológica e até mesmo de prevenção ao câncer que, como sabemos, não escolhe idade, raça, gênero ou condição social. Nesse sentido, o projeto de Navegação, que citei anteriormente, pode auxiliar a rede pública, já que ele permite o acompanhamento desse paciente desde os primeiros sinais da doença, por isso, tenho defendido a sua ampliação.

 

JC - O que fazer para melhorar o tratamento dos pacientes com câncer?

SG - Além da maior oferta de exames e medicamentos de forma continuada, há um gargalo na integração dos vários atores que devem atuar para apoiar a jornada do paciente pelo sistema de saúde e contribuir com o diagnóstico precoce e a recuperação dos pacientes com câncer. É o famoso ‘falar a mesma língua’ e assim promover ações de acompanhamento e organização do fluxo dos usuários do SUS entre os pontos de atenção da rede de assistência à saúde, integrando os serviços diagnósticos, terapêuticos e de reabilitação. Isso é fundamental para dar mais qualidade de vida ao paciente oncológico e aumentar o índice de cura.

 

JC - Falta vontade política para melhorar o atendimento, a assistência aos pacientes com câncer?

SG - É só o que falta. Garantir o acesso do paciente à orientação individual, ao esclarecimento de dúvidas ao longo do seu tratamento, aos recursos de tecnologia e medicação adequados, e a outras medidas de assistência necessárias é dizer a esse paciente que o estado está ao lado dele lutando pela sua vida, que o Poder Público vai fazer tudo o que estiver ao seu alcance para que ele tenha sucesso no tratamento de uma doença que é tão agressiva. Em 2024, faz dez anos que eu tive o meu diagnóstico de câncer de mama, então, eu sei o que é passar os dias com o sentimento de desamparo enquanto se luta contra essa doença, e é por isso que não vou descansar até que os sergipanos tenham o direito à saúde plenamente assegurado e um tratamento oncológico digno.