29/07/2024 as 08:38

ENTREVISTA

“A revitalização do Centro deverá levar em conta uma grande convergência de necessidades”

Nesta entrevista para o Jornal da Cidade, o presidente da Emurb, Sérgio Ferrari, dá mais detalhes sobre a iniciativa que mira um futuro financiamento para o projeto.

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Por MAYUSANE MATSUNAE

Diante de um debate recente sobre a recuperação de centros históricos de diversas cidades em todo o mundo, a prefeitura de Aracaju vislumbrou a possibilidade de impulsionar um dos objetivos do planejamento estratégico 2017-2024: a revitalização do centro de Aracaju. Há pelo menos seis anos trabalhando em estudos internos e pesquisas intersetoriais para obter diagnósticos preliminares sobre a região, a gestão municipal chegou a um novo momento deste projeto, com a realização do seminário de co-criação para o centro histórico de Aracaju, evento que estabeleceu a convergência de ideias e a troca de experiências sobre diversos casos de sucesso no brasil e outros países. O encontro contou com a presença de consultores do banco interamericano de desenvolvimento (BID), que já financiou outras obras na capital, a exemplo da reforma do parque da sementeira e da construção da avenida perimetral oeste, e resultou no apontamento de possíveis caminhos para a reestruturação da área central da capital sergipana. Nesta entrevista para o Jornal da Cidade, o presidente da Emurb, Sérgio Ferrari, dá mais detalhes sobre a iniciativa que mira um futuro financiamento para o projeto. Confira:

JORNAL DA CIDADE - Qual foi o norte que guiou o seminário que discutiu a revitalização do Centro? A gestão municipal elaborou um diagnóstico para embasar as discussões?
SÉRGIO FERRARI – Desde a concepção do Planejamento Estratégico sempre esteve presente a pauta da revitalização do Centro. Inicialmente, era um processo subordinado à Secretaria Municipal do Planejamento, Orçamento e Gestão (Seplog). Em meados de 2020, esse processo passou para a Emurb. Formamos uma equipe para discutir internamente e uma comissão, coordenada pela arquiteta Lucy Lobão, procurou todas as secretarias do município, sem exceção, com os seguintes questionamentos: ‘Qual o problema do Centro? ’ ‘Quais as principais deficiências desse local? ’ Conversamos com as outras pastas e chegamos a um primeiro diagnóstico. Depois, foi organizada uma série de visitas ao Centro por arquitetos da Prefeitura para ver esses problemas in loco. Ao final, foram feitas sugestões para buscar soluções. Foi produzido um relatório desse diagnóstico e apresentado ao prefeito. À época, um financiamento ainda não era uma possibilidade, mas já havia uma primeira avaliação. Demos um segundo passo: trazer especialistas no assunto, que pudessem contribuir para a elaboração de uma avaliação mais precisa. Fizemos essa busca até que o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ano passado, durante a revisão do projeto executado em Aracaju, sugeriu que consultássemos alguns especialistas deles, já que eles possuem experiência em financiar reconstrução de centros urbanos. Desde fevereiro temos conversado, na maior parte das vezes de forma virtual, até que, em maio, eles trouxeram três especialistas para debater conosco. Apresentamos o nosso trabalho, ouvimos as ideias, fizemos novas visitas ao Centro, e isso gerou o Seminário de Co-Criação para o Centro Histórico de Aracaju.

JC – O seminário contou com a participação de especialistas de cidades brasileiras e internacionais. Como essas contribuições poderão auxiliar Aracaju no processo de reestruturação do Centro?
SF – É muito construtivo debater com cidades que, apesar de terem diferentes problemas, conseguiram avançar na revitalização de seus centros, mesmo que com dificuldades. Não é um processo simples. Quando se faz um financiamento para uma obra comum, há o começo, o meio e o fim pré-definidos. Na infraestrutura de um bairro, por exemplo, sabemos que precisamos executar o padrão de implantação de rede de esgoto, rede de drenagem e pavimentação. É fácil de formatar. A questão do Centro é mais complicada, porque há uma grande convergência de necessidades, seja comercial, habitacional, cultural, de turismo, gastronomia e esporte. Existe um cruzamento de interesses por todas as pastas do município e segmentos da sociedade, como o comércio. O bom de conversar com outros municípios é que eles relatam não somente o que funcionou, mas também as experiências que deram errado. Ouvimos profissionais de cidades como Recife (PE), Campo Grande (MS), São Luís (MA), Niterói (RJ) e outros, e todos tiveram dificuldades, erraram, revisaram projetos. Em Recife, por exemplo, inicialmente foi trabalhada a ideia de que bastava levar atividades, como gastronomia, festas, e não resolveu o problema. Hoje, eles refletem para elaborar um programa diferente. Em Campo Grande houve sucesso, mas o trabalho de implantação subterrânea da fiação de energia elétrica e iluminação subterrânea, apesar de ter sido feita em oito meses, provocou conflitos com os comerciantes. Então, já temos a noção de que fazer o mesmo trabalho em Aracaju demanda um acesso mais amplo para o comércio durante a execução. Em São Luís, capital que possui um centro histórico maior e mais habitado que o de Aracaju, há um problema do ponto de vista do patrimônio, por ser uma cidade de quase 400 anos. Lá, muitas pessoas moram no Centro. Eles farão intervenções no Mercado, na parte de acessibilidade e habitação. Eles vão trazer consultores maranhenses que estão trabalhando nesse projeto para conhecer e ver como funciona o nosso mercado. Isso é o que o debate traz de valoroso.

JC – Qual foi o resultado final do seminário? Que projeto nasceu das discussões?
SF – O intuito do seminário era trocar ideias e experiências e, sob esse aspecto, ele foi extremamente importante, porque foi não somente para o pessoal da Emurb, mas foi aberto a toda a Prefeitura e órgãos externos, como CREA, Governo do Estado, entre outros. No que a gente pretendia, que era o debate, fomos plenamente atendidos. Demos um passo a mais. A partir do seminário, houve conversas com o prefeito Edvaldo Nogueira e com técnicos da Seminfra, de forma a começar a formular um Termo de Referência para contratar estudos mais aprofundados. Já foi sugerido pelos consultores do BID que saibamos o índice de pessoas que usam transporte coletivo para ir ao Centro, e essa informação já temos. Foi um dado levantado pela SMTT durante a elaboração da licitação do transporte público, que está em andamento. Esse debate nos permite estudar antes de fazer alguma proposta. Z JC – Para que a revitalização do Centro possa, de fato acontecer, há um caminho a ser percorrido. Quais são os próximos passos? SF – Ter mais reuniões com o BID, discutir o Termo de Referência para que se contrate consultoria ou estudos adicionais, e começar a levantar mais informações. É isso que vamos fazer agora: levantamento de dados e definir um termo de referência para consultoria.

JC – Além disso, por se tratar de um projeto grandioso, exigirá um volume significativo de recursos. A ideia é buscar um novo financiamento com o Banco Interamericano de Desenvolvimento?
SF – A ideia é que a gente possa formatar uma carta-consulta, que é o primeiro passo para conquistar o financiamento. Ela é encaminhada ao Governo Federal para que se tente obter autorização para buscar financiamento. Assim que conseguirmos essa autorização, começamos a levantar o volume de recursos necessário, a capacidade de endividamento da Prefeitura, a capacidade de pagamento, mas todos esses passos só serão dados depois que estabelecermos a ideia central da carta-consulta.

JC – Nos últimos anos, foram contratados empréstimos do Bid e do Brics, ambos para obras de infraestrutura. Essa experiência com financiamentos com bancos internacionais facilita o caminho para a busca de um novo financiamento?
SF – Cada vez mais, temos conhecimento de como fazer financiamentos. As equipes das Secretarias da Fazenda (Semfaz), Planejamento (Seplog) e Infraestrutura (Seminfra) já estão bem habilitadas para formatar carta-consulta sem precisar de consultoria externa. Talvez precisemos dessa consultoria apenas para definição de qual escopo iremos financiar. É muito simples buscar essa operação de crédito para uma obra de engenharia convencional, porque nesse caso o que se quer é muito objetivo. No caso da revitalização do Centro, como não é apenas uma obra de engenharia e envolve muitas outras atividades da Prefeitura, primeiro é preciso definir de forma muito clara o que se quer.

JC – Então, depois desse processo, já é possível vislumbrar o que é necessário para revitalizar o Centro de Aracaju?
SF – Nós temos muitas ideias. Sabemos que o Mercado de Aracaju é a força vibrante, é quem concentra o movimento econômico do Centro. Aliado a ele, há todo o comércio dos calçadões. Isso é levado em conta. O que queremos fazer para aumentar mais o movimento no Centro? Fortalecer o turismo é uma possibilidade. E como se faz isso? Podemos criar estacionamentos para ônibus, estabelecendo um circuito turístico bem definido, que envolva não somente o Mercado, mas também os belos monumentos históricos, como o Palácio do Governo que foi recuperado, o Museu da Gente Sergipana e alguns casarões antigos. Esse é um ponto. Temos conhecimento do problema, mas ainda estamos construindo as soluções. Outro aspecto é a cultura. Mas através do que? Temos um evento muito bem-sucedido que atrai muita gente, que é o Natal Iluminado. Como podemos fazer para reproduzir isso sempre, durante todo o ano? Sabemos o que temos que fazer, mas ainda precisamos de estudos. Temos a proposta de ampliar os calçadões, embutir a fiação elétrica no subsolo, de melhorar a sensação térmica no Centro, que é muito quente e, por vezes, inóspito, mas ainda não temos isso formatado. Nosso objetivo é esse: primeiro, vamos estabelecer quais são as ações necessárias e de que forma serão feitas. É isso que está em momento de discussão.